
(Quase) todas as segundas-feiras eu abro a caixinha de perguntas do Instagram (@dr.karl.richard) para responder as dúvidas das seguidoras e seguidores sobre gestação, medicina fetal e outras coisas.
Aqui estão respostas mais completas para algumas dessas perguntas.
O que você acha da gravidez passar das 40 semanas?
Eu respondi uma pergunta muito parecida com essa no dia 15 de Junho e publiquei uma resposta num artigo mais completo que você pode ler clicando aqui.
Pessoalmente, eu não vejo vantagens em passar das 40 semanas. Para mim existem evidências suficientes para interromper a gestação entre 39 e 40 semanas, mas isso não precisa ocorrer necessariamente através de uma cesárea. Existe a opção do parto vaginal induzido! Se você tem dúvidas sobre como funciona a indução do trabalho de parto, dá uma olhada nesse artigo que eu escrevi sobre esse assunto.
Para um bebê com problema cardíaco é melhor o parto vaginal ou cesariano?
Como eu disse no Instagram, existem vários tipos de defeitos cardíacos, desde os mais graves até os mais leves e sem repercussão para o bebê. Mas vamos ampliar um pouco mais essa resposta.
De maneira geral, os defeitos cardíacos são divididos em dois grupos: os Cianóticos e os dependentes de um ducto aberto, os Ductais. Os grupos não são excludentes e um bebê pode pertencer aos dois grupos ao mesmo tempo. Se o bebê fizer parte de qualquer um desses grupos ele deve nascer numa maternidade com atendimento médico especializado em doenças cardíacas neonatais, o que significa um cardiologista pediátrico, uma UTI neonatal capacitada e acostumada a lidar com cardiopatas e, muitas vezes, um cirurgião cardíaco pediátrico à disposição.
Na grande maioria dos casos, quanto mais avançada estiver a gestação melhores são as chances do bebê resistir após o parto. A exceção são as doenças de ventrículo único. Tanto a ACOG como a AHA não indicam o parto cesariano eletivo para nenhum dos casos, mas admitem que o bem-estar fetal precisa ser rigidamente monitorado caso haja um trabalho de parto e que este não deve ser induzido. Partindo desse pressuposto, afirmo que as lesões com baixa repercussão na função cardíaca podem nascer por parto vaginal se houver como fazer um monitoramento constante do bebê durante o trabalho de parto, mas não vejo problemas em realizar uma cesárea.
Tive um aborto e a médica me pediu um cariótipo. Qual a sua opinião?
Perder um bebê, mesmo bem no começo, dói muito. Eu e minha esposa perdemos uma gestação bem inicial em Dezembro de 2019 e sofremos muito, mesmo sem nunca ter visto sequer o coraçãozinho batendo. O sentimento de impotência e a vontade de fazer qualquer coisa para evitar novamente essa dor é muito grande, mas o que a ciência diz a respeito disso?
Eu fiz um compilado num artigo que você pode ler clicando aqui. Mas resumindo, esse é um acontecimento muito comum e que fica mais frequente com o avançar da idade materna. Na maioria das vezes acontece por motivos que não podemos controlar ou identificar. A chance de perder a primeira gestação é de 11 a 13%. Se você já perdeu uma vez, a chance de perder a de novo aumenta para 14 a 21%. E se você já perdeu duas vezes, a chance de perder uma terceira ou quarta vez aumenta para 24 a 29% e 31 a 33% respectivamente. Ou seja, quanto mais vezes você perdeu, maiores são as chances de acontecer de novo.
Então não acho que seja necessário qualquer tipo de exame ou investigação após a primeira perda. O melhor é respirar fundo e virar a página. As chances de dar certo estão a seu favor.
O GO falou que posso pedir analgesia para o Parto Normal, mas não logo no começo porque pode atrapalhar o parto. É verdade?
Não atrapalha e, na realidade, pode até mesmo proteger seu bebê de algumas complicações associadas à dor tremenda do trabalho de parto e parto. Você sabia que essa dor terrível pode prejudicar seu bebê?
Essa dor é tão forte que produz alterações fisiológicas no seu corpo (além do trauma psicológico e sofrimento). A dor provoca uma resposta neurológica e hormonal ao estresse intenso que afetam múltiplos órgãos e sistemas maternos e fetais! Geralmente as mães saudáveis toleram bem essas mudanças, mas mas parturientes com algum problema de saúde (especialmente as com problemas de pressão ou problemas cardíacos) e os bebês não toleram tão bem essa resposta. Algumas dessas alterações são as seguintes:
- Hiperventilação intermitente. A respiração acelerada leva a baixas concentrações de gás carbônico no sangue o que diminui o drive respiratório e provoca a falta de oxigenação materna e fetal. Além disso, aumenta o pH sanguíneo, o que faz o oxigênio se ligar mais fortemente ao sangue materno e consequentemente diminui o repasse de oxigênio para o bebê. Esse pH alto também causa o fechamento dos vasos sanguíneos uterinos e diminui a capacidade do útero de alimentar e manter o bem-estar fetal.
- Efeitos neurohumorais. O estresse intenso da dor extrema aumenta muito os hormônios do tipo catecolaminas, também conhecidos por hormônios de "fuga ou luta", pois preparam o corpo para situações de perigo. Eles diminuem a circulação de sangue no corpo e concentram esse sangue nos músculos e no coração, diminuindo a circulação uterina e fetal, diminuindo a oxigenação do bebê.
- Efeitos psicológicos. Mulheres que passaram por dores excruciantes durante o trabalho de parto e parto têm mais chances de sofrer com Depressão Pós-parto e Transtorno de Estresse Pós-Traumático.
Todas essas condições são evitadas com o controle adequado da dor com medicações, especialmente a analgesia epidural. Mas se isso não te convenceu da necessidade de uma analgesia desde o começo do trabalho de parto, saiba que recentemente a ACOG publicou uma recomendação afirmando que a simples vontade da mãe é indicação suficiente para realizar a analgesia, independentemente da quantidade de filhos que ela já teve, grau de dilatação e progressão fetal - ou seja, pode ser iniciada a qualquer momento!!
Outra coisa, estudos mostraram que a analgesia:
- não aumenta o risco para cesáreas;
- não tem impacto significativo no progresso do trabalho de parto;
- não afeta a produção de leite e não diminui as chances de uma amamentação de sucesso;
- melhora a chance de amamentar!
- não é contra-indicado se você tiver dor nas costas.
- não piora a dor nas costas.
Estou convencido que diante disso a principal resistência dos médicos em relação à analgesia de parto é o desconhecimento de tantas vantagens. Ou a preguiça de não querer acompanhar um trabalho de parto.