
Todas as segundas-feiras eu abro a caixinha de perguntas do Instagram (@dr.karl.richard) para responder as dúvidas das seguidoras e seguidores sobre gestação, medicina fetal e outras coisas.
Aqui estão respostas mais completas para algumas dessas perguntas.
Quanto tempo dura o sangramento e secreções no pós-parto?
Primeiro vamos definir o que é pós-parto ou puerpério: é o período que começa imediatamente após o nascimento do bebê e termina entre 6 e 8 semanas depois. Mas nem todo mundo considera esse final, com a principal associação americana de obstetrícia estendendo até 12 semanas do parto e alguns autores levam até 12 meses!
Acontecem muitas coisas nesse período, mas vamos focar na loquiação - o sangramento e as secreções que ficam saindo depois do parto. Ela possui três ou quatro fases, dependendo da escola de obstetrícia que você considerar. São elas:
- Locchia rubra: é o sangramento vivo, dura alguns dias depois do parto.
- Locchia fusca: de cor vermelho acastanhado ou marrom, pode durar até o décimo dia!
- Locchia flava: um corrimento amarelado com cheiro estranho, vai até a terceira semana.
- Locchia alba: parece uma clara de ovo mais fluída, e dura mais um bom tempo.
Algumas escolas de obstetrícia consideram a segunda e a terceira fase como sendo Locchia serosa.
Altura uterina de 30 cm para 36 semanas é normal?
Antigamente, quando não havia ultrassom, a melhor maneira de saber se o bebê estava crescendo adequadamente é pela altura uterina, ou Regra de McDonald (não tem nada a ver com o restaurante de fast-food). Em alguns lugares sem ultrassom ainda é assim e alguns obstetras ainda usam essa medida.

O problema é que ela é muito subjetiva e pode haver variações entre um e outro médico, e além disso medidas alteradas podem significar problemas com o bebê ou com o líquido amniótico, embora seja possível, pela palpação, diferenciar entre os dois. Atualmente a melhor maneira para se estimar o tamanho do bebê e avaliar o líquido amniótico é pelo ultrassom. Nas minhas consultas, como possuo um aparelho de ultrassom e sei usá-lo, eu não meço mais a altura uterina e dou uma olhada no bebê em todas as consultas de pré-natal.
E respondendo sua pergunta, 30 cm de altura uterina para 36 semanas ainda está dentro do que consideramos "normal", mas eu pediria uma avaliação ultrassonográfica.
Estou com excesso de líquido amniótico (polidrâmnio) e sem Diabetes Gestacional, com outros parâmetros do ultrassom normais. Qual pode ser o problema e quais são os riscos?
Dizemos que alguém tem polidrâmnio quando há um excesso de líquido amniótico (ILA > 24 cm ou MB > 8 cm). Vou explorar mais esse assunto num artigo mais pra frente, mas por enquanto vamos ficar por aqui.
Acontece quando o bebê não está engolindo muito líquido amniótico ou urinando muito. Em muitos casos não sabemos a causa, mas ele pode estar associado à Diabetes Gestacional, Anemia Fetal ou outras condições que aumentam o trabalho do coração do bebê, Malformações estruturais e anomalias cromossômicas, algum problema neuromuscular que impede que ele engula o líquido amniótico, infecção fetal (pelo parvovirus B19, por exemplo), entre outras condições. Mas espera! Antes que você fique desesperada achando que seu bebê pode ter uma dessas doenças, saiba que quando uma delas está presente o líquido está muito muito aumentado, o que não parece ser o seu caso.
A maioria dos casos se resolve sozinho depois de um tempo. A preocupação do obstetra fica por conta de que a condição está associada desde algumas complicações leves a outras mais graves durante o parto, como a prematuridade, ruptura precoce da bolsa amniótica, prolapso do cordão umbilical, sangramento pós-parto ou só um trabalho de parto mais demorado ou um bebê mal-posicionado.
Bradicardia fetal, 19 horas de trabalho de parto, 6 cm de dilatação e contrações de 2 em 2 minutos, 1 hora sem evolução. Cesárea?
Sim, mas pela bradicardia fetal.
Sua pergunta é complexa e compreende vários fatores diferentes e dados clínicos que eu só conseguiria avaliar se estivesse pessoalmente presente durante o seu trabalho de parto. Mas vamos de dissecar a sua pergunta e explicar algumas coisas.
Bradicardia fetal... significa que o coração do bebê está batendo muito devagar. Durante o trabalho de parto acompanhamos o ritmo cardíaco fetal e existem três níveis de avaliação do traçado na cardiotocografia: categoria I, categoria II e categoria III (sim, médicos são muito criativos).
- categoria I (normal): significa que está tudo bem com o bebê. Podem ocorrer as chamadas "desacelerações precoces", que são bradicardias durante as contrações somente e apesar de assustar são benignas.
- categoria II (suspeita): a maneira mais fácil de explicar essa categoria é dizer que são os ritmos que não se encaixam nem na categoria I e nem na categoria III. Em alguns lugares eles chamam de traçados "atípicos". Podem ser normais ou alterados, por isso geralmente repetimos a avaliação depois de algum tempo para saber se melhorou ou piorou.
- categoria III (anormal): aqui entram as desacelerações "tardias" (acontecem depois da contração) ou "variáveis" (acontecem de maneira independente da contração) e também as bradicardias persistentes, ou seja, que não melhoram. Significa que o bebê não está recebendo oxigênio suficiente e talvez não aguente até o parto vaginal acontecer. Provavelmente foi isso que aconteceu com seu bebê.
19 horas de trabalho de parto... frequentemente as pessoas confundem o início do trabalho de parto e acabam dizendo que durou muito tempo, às vezes dias! O tempo gasto com a indução do trabalho de parto não deve ser computado nessa conta, porque ainda não começou o trabalho de parto.
Existem 4 períodos no trabalho de parto, sendo que na terceira e na última o bebê já nasceu!!
- 1º período: dilatação -- são contrações doloridas e regulares, que geralmente vêm a cada 2 - 5 minutos. A primeira fase (fase latente) tem duração variável entre algumas horas até alguns dias! A segunda fase (fase ativa) começa quando a mulher tem pelo menos 4 cm de dilatação.
- 2º período: expulsivo -- dilatação total (10 cm)! Agora começa a descida do bebê. Esse período pode durar de 1 a 3 horas! Alguns dividem esse período entre fase passiva e fase ativa. Termina com o nascimento do bebê.
- 3º período: dequitação -- é a saída da placenta, e pode durar até 1 hora.
- 4º período: observação -- ou período de Greenberg, dura 1 hora e serve para observar a recuperação imediata da mãe após o parto.
6 cm de dilatação e contrações de 2 em 2 minutos... significa que provavelmente você estava entrando na fase ativa do trabalho de parto. Quando é o primeiro parto de uma mulher consideramos que a fase ativa começa com 6 cm.
1 hora sem evolução... o critério clássico de evolução do trabalho de parto (Curva de Friedman) diz que em 1 hora deve haver pelo menos 0,5 cm de dilatação, mas critérios mais recentes (Curva de Zhang) são mais maleáveis e permitem evoluções mais lentas, principalmente nessa fase e quando é o primeiro parto.
Por isso eu acho que a indicação da sua cesárea foi por causa da bradicardia fetal e não pela evolução mais lenta do seu trabalho de parto. Aconteceu alguma coisa durante o seu trabalho de parto que não permitia seu bebê receber oxigênio de maneira adequada e como você estava longe de ganhar pela via vaginal, escolheram fazer uma cesárea de urgência.