
Vocês também encontrar essa mesma condição como Restrição do Crescimento Intrauterino (RCIU), mas eu prefiro a terminologia que está no título porque acho que faz mais sentido. Questão de gosto, pode chamar como você quiser.
Bem, se refere aos fetos (bebês que nasceram ainda) que possuem um peso estimado pelo ultrassom abaixo do percentil 10 do peso esperado para a idade gestacional. Complicou? Explico.
Quando surgiu o ultrassom na Obstetrícia, houve um imenso esforço para descobrir qual era o peso e tamanho normal para os bebês para cada semana de gestação. Parece fácil, mas é difícil definir o que é considerado normal. Por exemplo, um homem com uma altura de 1,90 m pode ser considerado anormal em algumas regiões do mundo, mas na Suécia ou na Noruega ele é considerado normal. Talvez nesses países um homem de 1,60 m talvez seja considerado baixo demais, mas no Brasil ele é considerado baixinho, mas normal. Agora, qualquer lugar do mundo vai considerar um homem de 1,20 m de altura anormal. Então a partir de qual medida consideramos anormal? É nesse momento que entra o conceito de percentil. Não vou entrar nos detalhes matemáticos da coisa, mas seu ultrassom deve conter o percentil ao lado do valor do peso e talvez para outras medidas também.
Vamos em frente. Seria muito fácil a gente parar por aí e passar uma régua dizendo que todo bebê abaixo do percentil 10 sofre com restrição fetal. Acontece que nem todos se encaixam nessa regra. Existem os bebês que são simplesmente pequenos por serem filhos de pais pequenos. E os filhos de pais grandes mas que são pequenos e não passaram da linha do percentil 10, será que não sofrem com restrição fetal? Então só avaliar o percentil não é suficiente, e de uns anos pra cá surgiu o um outro grupo de bebês, os pequenos para a idade gestacional (PIG).
Doutor, está ficando muito confuso... -- Calma, vai ficar tudo mais claro, vou fazer um resuminho daqui a pouco que vai deixar tudo mais fácil. Aguenta firme.
Os bebês pequenos para a idade gestacional são diferentes daqueles que sofrem com a restrição do crescimento fetal. Eles aparentam ser saudáveis, com uma velocidade de crescimento normal ao longo da gestação, líquido amniótico normal, Doppler normal, circunferência abdominal acima do percentil 1 e geralmente possuem pais que são mais baixos que a média. Portanto, para todos os efeitos, são bebês normais. Pequenos, mas completamente normais!
Já os bebês com restrição do crescimento fetal de verdade não tem uma velocidade de crescimento satisfatória, frequentemente possuem um líquido amniótico muito baixo, circunferência abdominal abaixo do percentil 1 e no pior dos casos, um Doppler alterado.
Investigando as causas
Eles precisam passar por uma investigação anatômica detalhada. Cerca de 10% dos bebês com restrição fetal possuem algum tipo de anomalia anatômica e até 60% dos bebês com alguma malformação sofrem com restrição fetal.
Além disso, estudos genéticos (NIPT, por exemplo) estão indicados nos seguintes casos:
restrição precoce (menos de 24 semanas) + restrição grave (abaixo do percentil 5) + restrição simétrica.
restrição + anomalia congênita.
restrição + marcadores menores para anomalias cromossômicas.
restrição + doença placentária (placenta gigante, presença de cistos placentários, muito branca)
A restrição fetal também pode ser causada por algum tipo de infecção materna. As mais comuns são as infecções por citomegalovírus, toxoplasmose, rubéola, varicela (catapora), malária (nas zonas endêmicas, como no norte do Brasil).
Também pode ser causada por uma doença materna relativamente rara, a Síndrome do Anticorpo Anti-Fosfolípide (SAAF), que é uma trombofilia. Não precisa pesquisar em todo mundo, mas as mulheres que já tiveram algum aborto ou perda gestacional, ou trombose, são elegíveis para essa investigação.
E agora, o que fazer?
Resposta curta: esperar e observar para escolher o momento para fazer o parto.
Respota longa: acreditamos que a RCF seja causada por uma incapacidade da placenta de transferir os nutrientes necessários para o bebê em desenvolvimento, e em algum momento esse bebê estará grande demais para essa placenta conseguir mantê-lo vivo, e é nesse momento que vamos fazer o parto.
Como sabemos que esse momento está chegando ou já chegou? Através da velocidade de crescimento fetal, do Perfil Biofísico Fetal e do estudo Doppler do bebê. Existe uma sequência de acontecimentos que nos mostram que o bebê está caminhando para uma insuficiência placentária grave:
Circunferência abdominal diminuída. O sangue é desviado do fígado e direcionado para o coração, diminuindo o tamanho do fígado e, consequentemente, da circunferência abdominal.
IP (ou PI) da Artéria Umbilical aumenta. A resistência vascular da placenta aumenta. Cerca de um terço da placenta não funciona mais.
IP (ou PI) da Artéria Cerebral Média diminui. Para tentar concentrar o sangue no cérebro.
Fluxo diastólico nulo ou negativo na Artéria Umbilical. Causado por um aumento ainda maior na resistência vascular placentária, e 60 a 70% da placenta não está mais funcionando.
Velocidade Sistólica aumenta na Artéria Cerebral Média. Secundário às alterações de gases no sangue. O bebê está com bem pouco oxigênio nesse momento.
IP (ou PI) da Artéria Cerebral Média se normaliza ou aumenta muito. Significa que o corpo do bebê não está mais conseguindo concentrar o pouco de oxigênio para preservar o cérebro.
Onda "a" nula ou negativa no Ducto Venoso + padrão pulsátil da Veia Umbilical. Significa que o coração está com dificuldades para continuar trabalhando.
Regurgitação tricúspide e fluxo reverso no arco aórtico. O bebê está em seus últimos momentos.
Dependendo do estágio em que o bebê se encontra fazemos ultrassons semanais ou com maior frequência, podendo chegar a várias vezes ao longo do dia. É importante lembrar que só vale a pena fazer isso se o bebê for prematuro e queremos aumentar as chances dele de sobreviver depois do parto.
O que a mãe pode fazer? Na realidade, não muito. Já foram estudados diferentes dietas, oxigênio, transfusão de plasma e administração de soro fisiológico, aspirina, repouso e anticoagulação (com Clexane, por exemplo). Nada disso possui evidências convincentes de que ajudam em alguma coisa. Até mesmo o Viagra já foi estudado, sem efeitos animadores.
E quando fazer o parto? Quer ver médicos discutindo? É só fazer essa pergunta para eles. Vários grandes estudos tentaram responder essa pergunta e até hoje não se chegou a uma conclusão. Quanto mais prematuro, mais difícil é tomar essa decisão. Sabemos que para os bebês entre 26 e 29 semanas, cada dia no útero aumenta as chances de sobrevivência em 2%.
Eu gosto das recomendações da ACOG porque eles não usam parâmetros únicos para avaliar esse momento, mas um conjunto de análises. Como regra geral, esses bebês não devem passar das 40 semanas. Se o Doppler estiver bom e sem alterações eles podem nascer com 39 semanas. Alterações no Doppler podem ou não indicar o parto a depender da idade gestacional e do bem-estar geral do bebê.
Parto vaginal ou cesárea? Quer ver médicos discutindo de novo? Então....
Existem estudos suficientes para apoiar uma tentativa de parto vaginal em bebês com Doppler normal, mas não acho prudente tentar em bebês com centralização fetal, ou seja, a partir do passo 2 daquela sequência de alterações que eu mencionei antes.
Se eu tive um bebê com restrição fetal significa que vou ter de novo? Na realidade, não. Claro que depende da causa. Ter um bebê com anomalia cromossômica aumenta um pouco a chance de acontecer de novo, mas os casos em que não foi encontrada uma causa específica não costumam se repetir em gestações subsequentes.
Mas existem algumas coisas que podem ajudar. Um intervalo maior entre as gestações, parar de fumar, tratar infecções, usar aspirina nas pacientes com risco maios de pré-eclâmpsia. Clexane ou heparina não ajudam, assim como mudanças alimentares, suplementos, tratar hipertensão ou repouso.